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quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

sábado, 8 de dezembro de 2007

Tropa de elite e para a Elite

Por Caio Dezorzi

O filme

Tropa de Elite, o filme de maior sucesso do cinema brasileiro, é tecnicamente muito bem feito. Também não é pra menos. Quem foi ao cinema viu a quantidade de patrocinadores que investiram na produção. Antes do filme começar são quase 5 minutos só mostrando os logos de grandes empresas. E como sabemos, quem paga a banda escolhe a música! E a burguesia brasileira não ia pagar pra fazerem um filme que mostrasse a verdade, ou seja, de que ela – a burguesia – é a real responsável pela barbárie em que vivem as porções marginalizadasda população carioca e de todo o Brasil.

O BOPE

O Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE) do RJ foi criado em 1978, durante a ditadura militar. Os primeiros 30 homens foram treinados pelo exército, que na época combatia os grupos que faziam guerrilha contra o regime. Já era de se esperar que o BOPE usasse a tortura como uma prática cotidiana. Na verdade, o BOPE é um grupo de extermínio da PM do Rio.

Para os marxistas, o Estado Burguês se constitui num bando de homens armados cuja função é gerenciar os negócios da burguesia. A polícia é, portanto, não uma instituição para garantir a segurança dos cidadãos, mas sim para garantir a segurança da classe dominante e seus negócios. Isso significa reprimir as classes exploradas e suas tentativas de organização. Já o crime organizado, em especial o tráfico de drogas, geralmente conta com a participação e ajuda da burguesia – parlamentares e empresários que viabilizam a entrada de drogas no país, financiam a produção e etc. Por isso que o Estado não acaba com o tráfico – que é mais um negócio da burguesia – mas utiliza o suposto combate ao tráfico para reprimir e criminalizar as parcelas mais oprimidas da sociedade. No Brasil estamos falando de pobres, geralmente negros.

O filme em questão coloca muito bem a questão da corrupção da PM (Polícia Militar). Servidores públicos que colocam a vida em risco pra ganhar uma merreca no fim do mês têm possibilidades muito grandes de se corromper. A baixa remuneração é uma das formas que tem o Estado para ter a PM nas mãos. O burguês que financia a campanha do Governador precisa que o PM seja mal remunerado, se corrompa e venda armas para os traficantes continuarem prosperando os negócios do burguês.
Porém, o filme, que é baseado no livro “Elite da Tropa” escrito por ex-agentes do
BOPE, passa a imagem de que o BOPE é “truculento”, porém honesto. Nada mais falso! Quais condições materiais são diferentes para que um agente do BOPE seja menos propenso à corrupção do que um agente da PM? Os homens do BOPE recebem o mesmo salário dos da PM com apenas uma gratificação de R$500,00 a mais por mês. Cá entre nós, quinhentinhos a mais não são suficientes para evitar a
corrupção!

Faca na Caveira

Mesmo para os valores democráticos burgueses é absurdo o uso do símbolo da morte para uma instituição do Estado. Os defensores do BOPE argumentam que o símbolo do batalhão é “anti-morte”, pois a faca que atravessa o crânio representaria a vitória sobre a morte (simbolizada pela caveira). Mas esse argumento não cola. O que fica evidente para qualquer um que vê o símbolo é a caveira e não a faca “vencendo” a caveira. Além do mais, os próprios integrantes do batalhão tratam uns aos outros como “caveiras”. O BOPE é um grupo de extermínio. As músicas que cantam nos treinamentos demonstram isso com uma clareza assustadora: “Homem de Preto o que é que você faz? Eu faço coisas que assustam Satanás!” e “Homem de Preto qual é a sua missão? Entrar pela favela e deixar corpos no chão!”. Mesmo que fossem “honestos” nada justifica a tortura e o extermínio como prática de qualquer instituição.

Caveirão

O filme mostra o BOPE em 1997, dez anos atrás. Hoje o buraco é mais embaixo. O BOPE hoje tem tanques blindados que sobem os morros como verdadeiras máquinas da morte. Esse blindado foi batizado de Caveirão e já foi alvo de matérias do nosso jornal nas quais denunciamos as atrocidades contra as populações pobres
realizadas com o uso destes.

Droga de Imprensa

A revista Veja usou o sucesso do filme para “provar” que a sociedade precisa de mais BOPE, mais tortura, mais repressão, mais extermínio nas favelas. Veja encomendou uma pesquisa para o Vox Populi que lhes deu os seguintes resultados:
53% julgam o Capitão Nascimento um herói; 72% consideram que os traficantes do filme são tratados como merecem; 85% concordam que a culpa pela existência dos traficantes é dos usuários de drogas! Veja ainda elogia o filme por colocar “os pingos nos is” pois “bandidos são bandidos e não vítimas da questão social”. Logo devem ser exterminados mesmo! Ocorre que no Brasil não está instituída a pena de morte. Veja ainda ousa publicar que não são tomadas as medidas óbvias que se conclui a partir do filme, porque o Brasil “é um país de idéias fora do lugar por causa da afecção ideológica esquerdista”.

As Crianças

O filme cumpriu o papel que os patrocinadores esperavam. Apesar de várias sentenças na narração do Capitão Nascimento que mostram a realidade, toda a montagem induz o espectador “senso comum” a deduzir que a solução é o BOPE. O diretor do filme tenta se defender dizendo que o filme mostra os dois lados, que é imparcial. Mas nada é imparcial. Numa versão pirateada o filme termina com um poema que coloca “não se sabe quem é mocinho e quem é vilão, quem é que vai e quem é que vem na contra-mão” – nessa versão ainda pode se deduzir que o BOPE
e os traficantes, ambos fazem a população trabalhadora de vítima. Mas os patrocinadores parecem não ter gostado do poema e na versão final que foi ao cinema não há poema e a última palavra é da 12 estourando a cara do traficante.

E o Capitão Nascimento é mesmo o herói da criançada! Wagner Moura argumenta que se o filme for exibido na Suécia ninguém vai considerar seu personagem um herói. Bom ator, mas se faz de ingênuo. Talvez em outro planeta também não considerassem isso! Ocorre que estamos num determinado contexto histórico e social. As crianças que até 3 meses atrás brincavam de PCC (Primeiro Comando da Capital – facção criminosa de SP) hoje brincam de BOPE, simulam torturas com sacos plásticos na cabeça dos amiguinhos e repetem as falas dos personagens em tom militar: “01 pede pra sair!” e outro responde: “Eu desisto senhor!”.

Há Saída

Apesar do filme deixar margem para a conclusão de que não há saída ou de que a
saída é mais repressão, sabemos que a saída existe e não é o BOPE. Mesmo que o BOPE acabasse com o tráfico nas 700 favelas do Rio de Janeiro, o desemprego continuaria, a falta de políticas públicas de habitação, educação, saneamento, saúde, lazer, recreação e cultura, continuariam. E portanto, os burgueses que investem no ramo das drogas ilícitas continuariam encontrando terreno fértil para o subemprego do tráfico. E em 6 meses as 700 favelas do Rio estariam tomadas pelos traficantes novamente, que são apenas vítimas deste ramo dos negócios burgueses. Para os marxistas as drogas são instrumentos do imperialismo para controlar e destruir as gerações jovens. E por isso não se trata de culpar os usuários. Os responsáveis são os burgueses! Sob o capitalismo não há saída. É a barbárie mostrada no filme que crescerá cada vez mais. Mas a classe trabalhadora se movimenta, busca se organizar e forjar a saída para uma sociedade sem exploradores, onde a produção de tudo será controlada pelo povo trabalhador e não haverá necessidade de negócios escusos, drogas, violência, armas. A saída é a revolução socialista!

Publicado no jornal “Luta de Classes” edição Nº 07 – www.marxismo.org.br